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Só há um jeito de achar o tênis perfeito: testando

Anne Dias
Adicionada em 13 de dezembro de 2017
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Estava eu toda serelepe correndo quando passa por mim um corredor. Ele corria como eu, usava o mesmo relógio que eu, a bermuda era semelhante à minha e nós tínhamos nossas viseiras. Corredoris normalles. Mas o que o tornava um corredororis sapientae era outra coisa: em cada pé ele calçou um tênis diferente. Marcas rivais, inimigas mortais. Aquilo mexeu comigo num nível que até hoje penso no tenro senhor.

E ele tem toda a razão. Nosso lado direito é completamente diferente do esquerdo. Olhe suas mãos, coxas, panturrilhas. Não é à toa que Gisele Bündchen só fotografa com a cabeça um doze avos para a direita — ou esquerda, não me lembro bem. Porque, se ela o fizer de frente, meu amigo, a bicha é torta, te garanto.

E se nosso corpo é assimétrico, por que diabos os pares de tênis deveriam ser iguais? Foi o que esse cara sacou. Infelizmente não sei qual foi a conclusão alcançada — e também nunca mais vi nem ele nem nenhuma outra pessoa com tênis descoordenado.

Chegamos até aqui para que eu possa te falar uma coisa: sabe como ele percebeu que usar modelos diferentes nos pés seria uma boa? Testando. Não há outro jeito de conhecer o tênis perfeito se não for por tentativa, acerto e erro. Muita gente quer pegar atalho, perguntando para uns e outros qual é o melhor tênis da vida. Em geral, o que ela recebe é uma resposta complicadíssima, digna de mestrado no MIT:

— Eu gosto do Woodpecker Ghostwriter Sophisticated da Frosscountry. Mas tem que ser o 12, porque o 13 não tem um cabedal largo e o fisioquera pode soltar por volta do km 8. Ah, e não se esqueça dos pindomanos. Eles fazem muita diferença no pace.

 

 

Eu nunca pergunto, porque sei que não vou prestar atenção. Tênis que tem nome e sobrenome e que ainda pode soltar a fisioquera e tem pindomanos ferra com meu dia. Pior é que qualquer tênis tem até CPF. É muita coisa para decorar.

Há alguns anos, uma ultramaratonista me deu uma dica: ela sempre tinha R$ 200 na carteira. Se passasse em frente a uma loja e visse alguma coisa com desconto, ela comprava. Não era fiel a modelo, cor, nada. Hoje eu diria: fia, pagar R$ 200 num tênis só se for em outlet afastado numa cidade estranha dos Estados Unidos. Aconteceu alguma coisa enquanto eu dormia, porque encontrar tênis por menos de R$ 400, R$ 300 ficou mais difícil que encontrar o Silvio Santos na rua. E eu já encontrei o Silvio por aí.

O jeito que tem é resignar-se. Você vai gastar milhões até achar o tênis perfeito? Sim. E quando for hora de comprar outro, a marca já o terá trocado por um modelo mais moderno? Sim. O tênis de que seu primo gosta não presta para você? Aqui e ali, sim. Lá e acolá, não.

Nunca, jamais, em hipótese alguma, tenha preconceito. Tênis que não é de marca famosa, mas é barato pode beijar seus pés. E o caro, com tecnologia da Nasa, pode destruir suas panturrilhas. Ou vice-versa. E se você decidir correr com um modelo em cada pé e passar por mim, dê um tchauzinho. Vou saber do que se trata e passarei a tratá-lo como corredororis sapientae.

Anne Dias

Anne Dias

Jornalista com especialização em economia e com nove meia maratonas no currículo: duas W21, Meia Maratona das Pontes (Brasília), Disney, Corpore, São Paulo, Uberlândia, Porto Alegre e duas Golden 4 Asics. Concluiu também duas maratonas: Nova York e Buenos Aires. E não pretende parar.

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