Não queime seu filme na foto e na corrida

Harry Thomas Jr
Adicionada em 19 de novembro de 2019
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A piada interna é que minhas fotos de corrida só não queimam pois estamos na era digital. Mas seja no cromo ou nos pixels ultimamente minhas fotografias andam com o filme meio queimado.

Muito culpa do modelo que, com o passar das décadas correndo, nem sempre mostra o sorrizão, e quem dera mostrasse a língua, assim, meio good vibes para a galera.

Dias desses, uma amiga escreveu inconformada contando que em sua melhor foto de corrida daquela prova-alvo que se preparou por meses, um papagaio de pirata se postou logo atrás mandando um coraçãozinho ao melhor estilo Neymar após um gol.

“Compra!”, disse para ela para então emendar. “Na pior das hipóteses, tira ele com o Photoshop”! Valha-me.

Se não é minha cara de sofrência, os problemas partem também quando os fotógrafos partem meu corpo. Às vezes saio sem pé, sem mãos e quase sem cabeça.

Mas se não fosse esse detalhe momentâneo teríamos comprado a foto e enquadrado ela em destaque. É aquela hora que entramos no site de compra de fotos de corrida e vemos que foram tiradas 1747594363953 fotos suas e uma ou duas ficaram mais ou menos.

Mas não é só surpresas em nossas costas que temos. Há os corredores que vão mais à frente e estão mais para Boeing com seus aviõezinhos ou uma Fabiana Murer com seus saltos em altura. Pulam, saltam, mudam da faixa da direita para esquerda e vice-versa sem acender pisca-pisca e dar o alerta, e pior que sabemos que, diferentemente de muitos motoristas alcoolizados, nós corredores, teoricamente, estamos sãos. É endorfina que fala?

Amigos corredores, deixa eu contar. Os fotógrafos em sua grande maioria usam lentes teleobjetivas que captam vocês com perfeição dezenas de metros à frente e eles também são rápidos. Não há necessidade de ficar sambando tempos na frente deles. É pá e pum. E lembre-se vamos em frente que atrás vem gente.

É evidente que ninguém aqui é estraga prazeres e que podemos e devemos expressar nossa alegria. Mas temos que pensar na coletividade, nesta gente que “atrás vem”. Aliás, esse é um dos maiores legados da corrida, o do esporte solitário, mas solidário, que é feito com 5, 10, 50 mil pessoas ao seu lado.

Imagine se cada um desses milhares de corredores ao ver fotógrafos mudar seu traçado de corrida para fazer um coraçãozinho pensando no crush? O risco de um tombo é bastante grande. É um corredor desavisado que vem na batida e o atleta da frente que não sai da linha de foto por quase uma centena de metros e ao chegar em cima do fotógrafo desvia deixando quem vem atrás para um movimento brusco? Já vi gente pulando fotógrafo em situações iguais a essa!

É uma realidade que os fotógrafos podem e devem ficar postados no meio do percurso, mas isso é para o bem comum dos cliques.

A grande verdade é que podemos mostrar a língua, ensaiar um voo imaginário em nossos aviões ao melhor estilo Vanderlei Cordeiro de Lima, mas não devemos deixar que o narcisismo de encarnar um ator malabarista no meio de uma corrida de rua possa atrapalhar terceiros. A regra é simples. O direito da sua corrida começa quando termina com o meu.

Quanto ao coraçãozinho do cara atrás da minha amiga não há o que fazer. Só Photoshop salva!

Harry Thomas Jr

Harry Thomas Jr

Jornalista especializado em corridas de rua desde 1999, Harry competiu pela primeira vez em 1994 e desde então já completou 31 maratonas – sendo três sub 3 horas: São Paulo (2h59min30), Nova York (2h58min20) e Blumenau (2h58min10). Também concluiu seis Ultratrails: 60K Ultratrail Putaendo, 67K Ultratrail Torres del Paine, 50K Indomit Costa Esmeralda e os 50K Ultra Fiord por três vezes. Já correu em países como Argentina, Chile, Estados Unidos, Grécia e Japão.

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